A dor que dói
Descubra a relação entre dor, supermedicalização e efeito placebo com Dr. Alexandre Stehling, membro titular da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.
Descubra a relação entre dor, supermedicalização e efeito placebo com Dr. Alexandre Stehling, membro titular da Sociedade Brasileira de Clínica Médica.
O poeta português Fernando Pessoa fala do amor como “dor que desatina sem doer”. A dor que não dói. E para a dor da paixão, a receita clássica é uma nova paixão.
Se fizermos essa pergunta para qualquer um, a resposta provavelmente vai ser: “Tome um analgésico”. Coerente? Nem tanto.
Vivemos uma época de supermedicalização. Tem gente que toma remédio para a dor todos os dias. Sem orientação, sem supervisão. Muita gente não sabe, mas tomar analgésicos em excesso acaba por causar dor de cabeça. É… Remédio para dor causa dor. Que maluquice, não?
Mas maluquice é o que não falta no trato humano com seus males. Uma delas é o “efeito placebo”. Sabia que mais de um terço das pessoas que tomam pílula de açúcar achando que estão tomando analgésico melhoram da sua dor? Ou seja, elas próprias resolveram o problema,mesmo achando que foi um remédio que resolveu. Todos sabemos que beijinho da mamãe alivia tudo.
Mas aí entra em cena outro fator, além do “efeito placebo”. Instintivamente, quando damos uma “canelada” ficamos esfregando o local até amenizar a dor. Explicação?
“A propriocepção interfere na nocicepção”. Hein?
Traduzindo: Se você fechar os olhos e alguém movimentar seu braço, mesmo sem ver, você sabe se ele está para cima ou para baixo, virado de um jeito ou de outro. Essa é a propriocepção, a percepção de si mesmo. Já a nocicepção é a percepção de desconforto por calor, frio, pressão ou dor. Ou seja, quando estamos nos percebendo, a tendência é que as dores se aplaquem. Prestamos atenção no beijinho da mamãe e a dor se esvanece. Aplicação prática disso são aquelas bandagens que vemos nos ombros e coxas de atletas de alto nível. Chamadas de “spiraltaping” ou “kinectictaping”. Esparadrapoterapia, em bom português.
O uso de agulhas, a acupuntura, também é uma aplicação prática deste princípio. Só que nesse caso outros mecanismos estão envolvidos. Como a liberação de endorfinas, as morfinas que nosso corpo produz. E também a regulação energética do organismo, que na verdade é o responsável pelos efeitos mais intensos e duradouros da acupuntura.
Quem trabalha em pronto socorro sabe que o uso de morfina, por exemplo, no caso de cólica renal, é o que traz alívio mais rápido ao paciente. Antibióticos salvam a vida de muitas pessoas. Remédios melhoram a qualidade de vida de milhões.
Dipirona, às vezes, cai bem. Assim como uma cápsula de nimesulida. O problema não é o uso. E sim o abuso. Vivemos a hipermedicalização, e não só em relação aos medicamentos para dor. Precisamos, enquanto sociedade discutir esse assunto. A quem interessa esse estado de coisas e, principalmente, como mudar isso.
Como mudar isso? Como abordar a “epidemia” de depressão em que a humanidade está mergulhada, e que leva ao consumo de bilhões de comprimidos para as dores da alma?
Conversa que fica para outro dia.
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